[feel_____:THAT]

20061129

6 | 6 + ...

Finda a volta por Marrocos (cujo relato podemos dar finalmente por concluído, depois de interrupções e atrasos...), continua-se em trânsito neste blog.

Afinal, chegar e partir fazem parte da mesma viagem :D

20061128

6 | Asilah





Última cidade no nosso caminho antes da viagem de regresso.

Novas surpresas numa medina rica a fazer lembrar híbridos das antigas casas tradicionais do algarve: um Festival de Artes e Cultura deixou anualmente marcas nas paredes da cidade na forma de murais, pintados por vezes por artistas estrangeiros convidados, como o que podemos ver acima com a sua calorosa dedicatória.

Para além de apreciar a beleza desta cidade-aldeia - que é durante a época balnear um chamariz para os turistas mas que durante a nossa visita estava mais pacata do que Chefchouen - conseguimos ser alvo de uma perseguição por adolescentes ávidas de treinar o seu francês e o seu espanhol... afinal um turista é um turista.

As nossas fracas experiências culinárias tiveram de ser compensadas com uma visita exploratória à grande cadeia de supermercados da zona: o Marjane. Adoro ir a supermercados nas minhas viagens: é tão bom como ir a um bom museu! Ficam as memórias dos grandes pequenos almoços: sempre sumo de laranja (doce como o mel), café bem forte e aromático, croissant au chocolat e baguete com manteiga. O pequeno almoço local mais rico inclui também doce de laranja (claro!), mel e dois tipos de paquecas (beghrir e m'semmen creio eu) - hummmm. Variedades de tagines, couscous e espetadas - entre o sofrível e o bastante bom, mas nunca a cozinha excelente que sabemos que anda por lá! - passaram pelo nosso prato. Também ficaram por visitar os hammams, ou banhos públicos marroquinos - a bela data que escolhemos para viajar proporcionou experiências interessantes, mas excluiu esta...

O fim da viagem aproximava-se e foi o momento do balanço - regozijámo-nos por algumas fotos de pessoas que conhecemos e que se deixaram fotografar apesar do pânico generalizado que os marroquinos têm às fotografias tiradas por turistas.

O bom e o que ficou por fazer são razões bastantes para ficar a vontade de regressar. O sul e o deserto ficaram também guardados para essa outra viagem - até lá ficam as ideias e os sorrisos das memórias!



Nas fotografias: Um mural Elvira Méndez, pintado numa das praças principais da medina no âmbito do Festival de Asilah.

E ainda: + fotos da viagem :)

5 | Rabat





A chegada a Rabat foi acidentada: um par de horas de chuva e muita gente na estrada levaram a acidentes e trânsito lento - aí está uma coisa que é igual em todo o mundo... Depois claro quanto maior a cidade, mais difícil é saber onde se está e encontrar o Hotel. E uma vez que ia ser difícil de qualquer maneira, decidimos nesta primeira noite fazer um tour dos hotéis baratos da cidade. Foi uma aventura que, apesar do elevado interesse antropológico, não recomendo a ninguém que não esteja armado com um bom saco cama e desinfectante... e nós não estávamos claro. O que recomendo sem hesitações é uma estadia numa Riad - uma casa tradicional Marroquina, onde é obrigatório o pátio interior ladeado de arcadas e o uso dos materiais locais e padrões geométricos típicamente árabes. Trataram-nos muito bem!

Tal como nas outras cidades em que estivémos, esta divide-se entre a cidade 'nova' (colonial) e a cidade 'velha' (medieval e imperial). O que surpreendeu mais em Rabat foi a sua zona costeira, especialmente a pitoresca e
muito bem cuidada Kasbah a norte da Medina, com um ar de vila piscatória em tons terra, branco e azul.

Mais uma vez, encontrámos vários restaurantes fechados, por causa das ditas 'férias nacionais'. Em alternativa aventurámo-nos na zona pobre da medina, a sul, onde a comida era confeccionada e vendida em bancas noite dentro. Aqui também encontrámos pequenos restaurantes muito simples, equivalentes às nossas 'tascas' - nem toda a gente pôde tirar férias claro - onde se comeu bastante bem por um preço irrisório. Uma constante foi a sensação de segurança, mesmo nos locais mais improváveis.

Os mercados, ou souks, são abundantes na cidade e as ruas comerciais cobertas são calmas mas simultâneamente cheias de vida. Como sempre, os locais fazem-nos sentir muito bem vindas no país: um sincero "Bienvenue au Maroc" ouve-se várias vezes por dia - também nas lojas, quer se compre ou não!


Na fotografia: O Mausoléu de Mohammed V com vista para a Torre e ruínas da Mesquita Hassan (destruída no terramoto de 1755); Muro exterior a sul da Medina da cidade.

20061124

Votações e passeatas não-militares

Já há um tempo que não espreitava os blogs que por aí andam nem actualizava os meus links. A motivação foram os resultados da votação que o Geração Rasca promoveu, mas os blogs são como as cerejas já se sabe e acabei a espreitar outros para além dessa lista claro. Aqui ficam os meus achados:

Maresia - ou as-verdades-no-feminino. Gostei muuuiito.

Um leva ao outro: um Estranho Amor - notas e dores no masculino.

Cenas de Gaja - humm... eu sou gaja e gosto de ler as cenas?

As crónicas das horas perdidas - algures entre a perspectiva sociológica e a psicológica... Também tenho algumas destas mas não são publicáveis.

Kontratempos e referências da actualidade. Mais reflecções sobre sociedade e política são bem-vindas.

Kanema

Continuando no tema das africanidades, aqui fica a recomendação para este Festival de Cinema. Já só sobram mais dois dias de longas e curtas metragens de cinema africano, a ver em Lisboa no S. Jorge.

Eu estou com vontade de ir ver o filme Marroquino, claro...

20061122

4 | Meknès



Em Meknès reencontrámos uma escala mais humana na cidade.

Uma das experiências mais enternecedoras aqui foi a interacção com as crianças da cidade, por quem éramos abordadas sistemáticamente - cumprimentavam-nos em francês e depois sorriam envergonhadas quando viam o seu cumprimento devolvido.

O comércio também tinha uma dimensão local muito simpática - os preços a regatear começavam em valores menos astronómicos, talvez pela declarada confissão de que sem guia o preço podia ser mais baixo por não existir 'comissão'.

Em contraste com esta escala acolhedora da cidade, encontrámos também a grandeza das suas Praças Imperiais cheias de vida - lojas, cafés e grandes aglomerados de pessoas assistindo a espectáculos de rua. Tudo convidava à permanência mas o tempo correu depressa e a costa atlântica prometia.


Na fotografia: Portões da Muralha de Meknès na principal Praça Imperial da cidade, a Praça el-Hedime.

3 | Fez







Fez é uma das quatro capitais imperiais de Marrocos e a primeira que conhecemos nesta viagem. Esperávamos grandeza: já sabíamos que se tratava da antiga capital, que ali se encontrava a maior medina do país, grandes Palácios Imperiais e Mesquitas.

Começando pelo fim, não conseguimos entrar em nenhuma Mesquita - a política nacional é que elas estão fechadas a não-muçulmanos e ponto final. A minha desilusão por não poder conhecer esses espaços em Marrocos foi moderada, especialmente porque as minhas visitas a mesquitas noutros locais foram sempre sinónimo de algum desconforto - com o lenço na cabeça e a transformação do espaço de culto em espaço museu ambos forçados e mal amanhados... Quanto aos Palácios Imperiais a política era mais igualitária: fechados a todas as visitas. Ainda assim pudémos vislumbrar de passagem, com curiosidade, os portões e as grandes muralhas - o resto ficou imaginado.

A maior medina de Marrocos confirmou-se impressionante - conhecêmo-la com a ajuda de um guia, como aliás muitos nacionais também fazem. Depois de uma primeira experiência difícil de igualar com o nosso guia Ali em Tanger, o Abdul foi uma desilusão fácil: falou-nos mais das suas férias na Europa, na Suiça e na Finlândia, do que da sua cidade. Tentou fazer-nos um tour das lojas mas as férias pós-ramadão reflectiram-se numa visão particular da cidade e das suas ruas: muitas lojas e restaurantes fechados. Este é um período em que muitos marroquinos tiram entre dois dias e uma semana de férias, juntando-se muitas vezes às suas famílias que vivem nas zonas rurais.

Assim, conhecemos a fábrica de cerâmica (uma visão reminiscente do Iraque, que só me conseguiu convencer do facto de ser uma fábrica depois de ver de perto os fornos e a cerâmica produzida no típico barro cinza de Fez), e o bairro dos artesãos dos curtumes (nas fotos), onde ainda se utilizam métodos medievais, sem ninguém. A vantagem no caso dos curtumes foi que o esperado cheiro intenso a fezes de pombo (utilizadas como matéria-prima de custo zero para curtir as peles) estava algo atenuado, pelo menos se tentando comparar com as descrições apocalípticas com que nos cruzámos. Apesar de tudo mantivémo-nos agarradas ao nosso raminho de hortelã, qual amuleto contra o mau-cheiro...

Contudo, e apesar deste interregno comercial pós-ramadão, esta foi provavelmente a experiência mais fortemente mercantilizada numa das nossas 6 cidades. Aqui, estão habituados a receber muitos turistas e a tirar o melhor proveito possível disso.

Sem o contágio de qualquer encanto avassalador, mas também sem desencanto, seguimos a estrada para Méknes e daí para Rabat, duas das restantes três cidades imperiais do país.


Nas fotografias: Vista de parte do bairro dos artesãos dos curtumes e tinas de tratamento de peles; Vista de uma rua na Medina de Fez.

20061121

Outra banda sonora...

completamente diferente, é a banda sonora da minha viagem a Marrocos.

Chama-se Adhan e ouvia-se cinco vezes por dia nas ruas ou onde quer que se estivesse na cidade. O 'chamamento para a oração' ouvia-se de madrugada, - acho que só não me acordou na última noite (já estava a entrar na rotina...) -
ao meio dia, a meio da tarde, ao pôr-do-sol e ainda à noite um par de horas depois. Impossível esquecer onde se estava.

Tradicionalmente seria o muezzin a fazer o chamamento para a oração, subindo ao topo do minarete da mesquita e entoando o chamamento em todas as direcções. Modernamente os altifalantes da mesquita desempenham essa tarefa...


O mais parecido que consegui encontrar com o que se ouve no Norte de Marrocos é este, mas o que lá se ouvia era menos melodioso e soava na realidade até um pouco agressivo. Muito me perguntei o que diriam eles no dito chamamento. Assim, aqui ficam a 'letra' e a 'música', para acompanhar as leituras e inspirar essas futuras viagens!

Allah is Most Great. Allah is Most Great.
I bear witness that there is none worthy of being worshipped except Allah.
I bear witness that Muhammad is the Apostle of Allah.
Come to prayer. Come to prayer.
Come to Success. Come to Success.
Allah is Most Great. Allah is Most Great.
There is none worthy of being worshipped except Allah.

The Arabic text of the adhan is similar for all five recitations (with a slight difference in the adhan recited for the pre-dawn prayer, which adds the line "Prayer is better than sleep").


A minha palmeira é muito porreira, eu sei

Tu ficas louquinha quando tiro a casca à banana
Ficas tão tontinha que a tua cauda abana
Como o macaco gosta de banana, eu gosto de ti (de banaaana!)


Faltava a cereja no topo. Pronto agora já está! Hehe...

O homem por detrás do mito

José Cid merece mais espaço de post. E para perceber porquê aqui fica uma das suas grandes frases:


"A nova geração tem de descobrir qual é o seu dinossauro. Todos os países têm o seu dinossauro. Os franceses têm o Johnny Halliday, os espanhóis o Miguel Rios. Ambos são uma porcaria ao pé de mim. Sou infinitamente melhor do que eles e tenho uma melhor estética."
in Pública, 2003


Caso subsistam dúvidas é favor rever a foto já linkada ao post em baixo.

Favas!

Quem foi ontem ao Casino de Lisboa sabe que este homem deu um concerto brilhante para uma multidão em êxtase.

Tenho de partilhar isto convosco porque foi lindo
... Nunca tanta gente junta gritou "favas" ao mesmo tempo!


[+] Até há fãs que disponibilizam downloads, sonhos e há a Malta do Cid. Ah pois é.

20061115

2 | Chefchouen




A estrada sinuosa leva-nos às montanhas do Rif.

Descobrimos Chefchouen à noite, escondida entre as montanhas e cheia dessa grande actividade nocturna que enche as ruas durante o Ramadão.

Respira-se tranquilidade na pequena cidade - os locais são amistosos e hospitaleiros, dão-nos as boas vindas ao país e lamentam-se de não serem visitados por mais turistas. Pela sua localização e acessibilidade limitada, escapou ao grande turismo e para além da sua grande beleza cénica mantém uma aura muito genuína. Há no entanto algum turismo alternativo na cidade, associado às grandes plantações de marijuana nas montanhas que rodeiam a cidade.

Chefchouen seduz pelas suas particularidades: a sua íngreme medina tem uma escala muito humana, à prova de turistas desorientados, e é toda ela pintada em tons de azul claro - em vez do tradicional verde, a cor do islão, por influência da grande comunidade judaica que habitou a cidade.

Um poiso seguro antes do regresso à estrada de montanha.


Na fotografia: detalhe da sinuosa medina (cidade velha) de Chefchouen.

20061114

1 | Tanger



Entre o Mar e o Oceano, o ponto de partida da nossa viagem.

Aqui ficou claro que o estreito que separa Marrocos da Europa parece bem mais pequeno quando se está do lado de lá. O primeiro contacto com os Marroquinos, depois da longa e complexa passagem no controlo alfandegário e fronteiriço, foi um encontro com a história. Começaram também aqui os inúmeros encontros com a nossa língua.

Em Tânger cruzam-se civilizações. Pela cidade vêm-se nomes de rua em espanhol, francês e árabe. O trânsito é um caos, em particular à noite quando as ruas se enchem, agressivas para os estrangeiros ignorantes das regras e das excepções às regras.

Com a chegada da manhã aventuramo-nos na medina, desta vez a pé. Conhecemos o Ali, um comunicador nato que inspira confiança. Fala português, espanhol, francês, inglês e árabe. Conhece a história do seu país e a antiga ligação a Portugal melhor do que alguma vez a ouvi descrita em alguma conversa corriqueira do nosso lado do Mar. Logo na Praça Central os canhões apontados à Europa, são os dos próprios europeus. Portugal, Espanha e França fazem-se representar.

Convida-nos para um pequeno-almoço no café central: café forte e aromático, acompanhado do primeiro de muitos sumos de laranja doces como o mel.
Avisa-nos dos jovens que se querem aproximar demais das estrangeiras, do preço a pagar pelas nossas compras (50%, ou menos, do que o preço pedido) e das cautelas a ter na estrada. Fala da religião através dos valores humanos que nela encontra, essas regras sociais de boa convivência que todas avançam e o valor da vida. Descobrimos que aqui as sardinhas na grelha também são o prato forte do verão, mas com o extra de serem recheadas com ervas aromáticas e condimentos!

Quase no final do nosso passeio, 'salva-nos', quase literalmente, do que poderia ter sido o incidente mais espinhoso da viagem, e que atraiu uma multidão no centro de um cruzamento: o falso atropelamento de um jovem ciclista que procurava o dinheiro fácil que a matrícula estrangeira prometia.

Depois de tanta demonstração de serena sabedoria nem queríamos acreditar: Ali aprendeu quase tudo o que sabe informalmente com os seus pares e com os mais velhos. Tem 65 anos, 18 netos e é analfabeto, tal como cerca de 55% da população do país.

A viagem de noite até à cidade seguinte correria bem, prometeu - inch'allah (se deus quiser - ou oxalá, como dizemos em português). Como o Ali gostou de saber que este resquício da presença do seu povo em terras lusas permanecia no nosso discurso! Fez-nos felizes conseguir estreitar por momentos essa enorme distância psicológica que nos separa como povos e que nem a proximidade geográfica parece conseguir atenuar.


Na fotografia: entre o Cabo Spartel e as Grutas de Hércules, nos arredores de Tanger.

6 cidades | 6 noites

Notas de uma viagem na estrada de costa a costa pelo Norte de Marrocos.

Do Mediterrâneo ao Atlântico, passando pelas montanhas do Rif.

20061112

Portanto,

neste blog descansa-se mais do que se escreve... Por esta ignomínia a casa apresenta as suas sentidas desculpas.

Os trabalhos de recuperação pós-férias já decorreram e a turma dos
faits divers promete deixar-me em paz brevemente para poder voltar à minha saudosa persona virtual...

Ai ai... até breve :D